Histórias do campo, na cidade. O sítio orgânico que é amigo da criançada.

O agricultor Robson em seu sítio orgânico. Créditos: Jornal Onews

 

Histórias do campo, na cidade. O sítio orgânico amigo da criançada.

pelo agricultor Robson do sítio Baruc, em 28 de agosto de 2020, Brasil.

 

Na década de 90 fui gerente de um grande restaurante japonês e nós utilizávamos muitas verduras.

Era muito comum esses produtos chegarem e você sentir o cheiro do agrotóxico. Eu me sentia muito mal em fornecer esse tipo de alimento aos meus clientes. Foi aí que começou a nascer o sonho de comprar um Sítio e de fato colocar a mão na terra.

Como vocês estão vendo obtive sucesso.

Sítio Baruc em Ibiúna. Créditos: Jornal Onews

Plantar e Amar

Nosso dia começa bem cedo, próximo das 6:00hs iniciamos nossas atividades, de segunda à quinta-feira a primeira tarefa do dia é um dos momentos mais agradáveis numa horta, a colheita, ela também tem sua arte, para não pôr a perder todo o trabalho anterior. É na hora da colheita que mais se percebe a importância das hortas orgânicas, mesmo que reduzidas, pois quanto menor tempo houver entre a colheita e o consumo melhor.

Feito isto, esses produtos são encaminhados para higienização e para serem embalados para comercialização. Normalmente à tarde uma parte da equipe retorna aos canteiros para fazer o que chamamos aqui de Tratos e Carinhos, é o que os agrônomos chamam de tratos culturais. Este trabalho acontece todos os dias. Não é só plantar regar e ficar esperando.

As hortaliças precisam também de uma série de cuidados e mimos como afofamento da terra, controles de ervas daninhas, pragas e muita conversa… para que o verde se anuncie de forma exuberante alegrando corações. Pode parecer estranho, mas é pelo coração que me ligo a minha horta. Estranho porque para muitos a relação acontece através da boca, gosto da minha horta mesmo que não tenha nada para colher, ou melhor, há sempre o que colher, só que não para comer.

O por do Sol no sítio. Créditos: Jornal Onews

o solo orgânico

Ao contrário do que aparenta o solo Brasileiro não é rico, a maior parte do território nacional é composta de solos velhos, desgastados e geralmente acidificados. O solo doente é muito compactado sem poros por onde penetrem a água e o ar, com isso as raízes não conseguem se aprofundar e quase não há vida no solo.

O resultado é a baixa produtividade. No solo sadio a vida é intensa, milhares de microrganismos e outros bichinhos cavam buracos e túneis, a terra se torna porosa, fofa, permeável à água e ao ar. As raízes se expandem sem obstáculos para buscar nutrientes.

O primeiro passo para deixar este solo sadio é fazer uma análise de solo para identificar suas deficiências nutricionais e adotar um manejo adequado ao solo, como adubação verde, rotação de culturas e período de pousio. Aqui no Sítio demoramos Três anos para atingir um equilíbrio adequado, anualmente este solo trabalha oito meses e descansa o restante do período, mas sempre acompanhado de uma adubação verde, que consiste em plantar uma cultura para ser incorporada ao solo e auxiliar em suas deficiências nutricionais.

Brincar com a terra, conquistar sua dureza, misturar o esterco esfarelado, senti-la leve e solta e diante dos nossos olhos a terra, de coisa estéril, dura e virgem é agora Mãe Terra. Tenho uma horta porque preciso dela, como preciso de alguém a quem amo.

O solo orgânico. Créditos: Jornal Onews

as pragas

O primeiro remédio para prevenir doenças e pragas é um permanente cuidado com o solo. Um ataque de praga ou doença é sinal de que em algum lugar está havendo desequilíbrio.

As doenças do homem também ocorrem em organismos enfraquecidos. Mesmo que a urgência do problema nos obrigue a combater primeiro os sintomas, só a remoção das causas do desequilíbrio eliminará a incidência de pragas e doenças.

Ninguém pode passar a vida toda comendo apenas arroz, feijão e pão. Um pouco de ferro na alimentação humana é sempre necessário.

Para que a planta tenha saúde, é preciso devolver ao solo todos os elementos que o vegetal retirou dele. O que está acontecendo com a chamada agricultura moderna, é que se retiram do solo vários elementos, mas devolve-se apenas três, nitrogênio, fósforo e potássio. O resultado é chamado por alguns autores de “fome oculta”, os alimentos não têm gosto, não tem sabor, não são completos. A planta é um ser vivo e, como tal, nem melhor nem pior que o homem, apenas semelhante “Tu és pó e ao pó retornarás”.

Então, não custa reavivar um pouco a memória para lembrar que não estamos isolados, e sim dentro de um sistema formado por muitos outros seres. Um sistema que é cíclico. E esse ciclo tem seu início nos vegetais.

Canteiros orgânicos no sítio Baruc. Créditos: Jornal Onews

a irrigação

A água é fundamental para as plantas, sem ela os vegetais não conseguem absorver os nutrientes disponíveis no solo. As regas devem atingir as raízes das plantas, pois são elas que levam essa água até as folhas, através de pequenos canais semelhantes as veias dos homens.

Quando falta água, as plantas acionam um mecanismo interno de sobrevivência e murcham. É sinal de socorro. A falta de água retarda o crescimento, piora a qualidade, acelera a maturação e diminui a produtividade. Mas, como em tudo na vida, aqui também deve haver equilíbrio, pois o excesso de água é igualmente prejudicial. As regas não devem ocorrer sob sol forte, de preferência no final da tarde para manter a umidade do solo por mais tempo. E neste momento de frescor, a horta, como forma de retribuição, apresenta um banquete de perfumes. Horta é coisa boa de se cheirar.

É daqueles momentos que você cheira fundo e para isso até fecha os olhos, porque o cheiro vai mais dentro que os olhos, está dizendo o quanto ama.

O processo de irrigação automático nos canteiros orgânicos do sítio Baruc. Créditos: Jornal Onews
Higienização das verduras. Créditos: Jornal Onews

o trabalho da feira orgânica nas escolas

O projeto Baruc estava concluindo seu primeiro ano com sucesso, mas ainda faltava o desafio da comercialização. Um dia entrando na escola com meu filho, surgiu a ideia- por que não aqui?

Seria um conforto ter uma feira cedinho na escola? Eu mesmo normalmente saia as compras após a entrada e também buscava um lugar onde pudesse não só comercializar, mas também poder contar todas as particularidades de cada produto, seus valores nutricionais e receitas praticas para consumi-los. Pode parecer estranho, mas a comercialização também é um momento de despedida. Horta se parece com filho, a gente vai cuidando, vai se alegrando a cada momento, é uma sensação de euforia, de fertilidade.

Conforta o coração comercializar o produto com seu “histórico familiar”.

Assim em 2005 montamos nossa primeira banca dentro de uma escola Waldorf. Foi incrível o interesse das crianças pelas estórias contadas de forma lúdica sobre o crescimento de cada planta, levava a flor da cenoura do alho porró, flores que em geral nem os Pais conheciam.

Em pouco tempo conseguimos montar um projeto onde a classe do segundo ano visita o Sítio para plantar milho e feijão e depois de 4 meses retornam para fazer a colheita, com terceiro ano plantamos trigo, um projeto lindo que se chama do grão ao pão, as crianças plantam, colhem, moem o trigo e fazemos o pão na própria escola. Nestas visitas sempre fazemos um passeio pelos canteiros mostrando pra eles as diversas culturas, os cuidados que devemos ter, o trabalho intenso empregado e o respeito que devemos ter com os alimentos.

É gratificante ouvir uma mãe contando que seu filho estava lutando para pegar até o último grão de arroz do prato… senão ele fica triste mãe, e vai parar no lixo!!

A feira na escola Castanheiras, ás terças e quintas. Créditos: Jornal Onews

o impacto da pandemia de covid 19 para o sítio Baruc

O cancelamento dos eventos no Sítio e uma queda de 30% no faturamento, foram os primeiros impactos, também reduzimos o trabalho para duas feiras semanais e implementamos o serviço de delivery em nossas vendas. Quanto a nossa equipe foi possível manter todos, porém com novas normas de procedimento para higienização, embalagem e principalmente nos pontos de venda.

Enfim diante de tantas notícias tristes estamos seguindo, procurando evoluir com esta nova realidade, entendendo mais a importância de nossas atitudes como sociedade para manter o equilíbrio da natureza. É terrível montar nossa feira sem a presença dos alunos, aquela orquestra que emite muitos graves e agudos agora se transformou em um silêncio ensurdecedor, provoca muitas saudades, sinto muito a falta deles.

Embalagens com selo de certificação de produto orgânico. Créditos: Jornal Onews

os ensinamentos pós pandemia

Fico imaginando nosso planeta sem o ser humano, ele estaria em perfeita harmonia… Cada pedaço de terra é um “mundo” que é preciso observar, compreender e ao qual homem deve se integrar, como um elemento a mais, que com sua ação vai modificar todo o conjunto anterior, pois qualquer mudança por menor que seja altera a totalidade, e por isso deve ser feita com muito respeito.

Precisamos cuidar melhor da nossa casa, todos nos participamos desta enorme cadeia produtiva global, mas estamos causando desequilíbrios desde sempre, tanta vontade de criar o que nos satisfaz que nem reparamos no preço que nos custa, mas a conta sempre chega não é mesmo?

Esse vírus é consequência desses desequilíbrios, desmatamentos, queimadas, poluição, desigualdade social, chegou a hora de parar de varrer a sujeira embaixo do tapete.

o planejamento para o futuro

Desenvolver uma linha de produtos higienizados.

Montar um curso de culinária focado em nutrientes x formas de cocção.

Expansão dos pontos de venda e ser papai novamente. Seria bom saber que alguém colherá coisas que nós semeamos, depois de nossa partida, e as plantas continuarão, como um gesto nosso de amor.

Sítio Baruc. Créditos: Jornal Onews
Agricultor Robson durante a entrevista. Créditos: Jornal Onews

 

Produtos orgânicos em processo de embalagem. Créditos: Jornal Onews
Sítio Baruc. Créditos: Jornal Onews
Canteiros orgânicso. Créditos: Jornal Onews
Canteiro de alface orgânica. Créditos: Jornal Onews
O agricultor Robson ensinando sobre análise de solo para a equipe do jornal. Créditos: Jornal Onews
Equipe do jornal no sítio Baruc. Créditos: Jornal Onews
Solo em pousio. Créditos: Jornal Onews
Processo de adequação de quantidade e qualidade do sítio Baruc. Créditos: Jornal Onews
Alfaces orgânicas do sítio Baruc. Créditos: Jornal Onews
Sítio Baruc. Créditos: Jornal Onews
Tomates embalados com selo de certificação. Créditos: Jornal Onews

 

Neste link assista a matéria pelo Canal do Jornal Onews no YouTube:

https://youtu.be/BTgPijCZLqg